Escritório Virtual – Boletim Junho 2023
Intolerância
Arco-íris sobre o Pão de Açúcar (foto: arquivo pessoal)
Intolerância é o nome de um aclamado filme, lançado em 1916, de um dos pioneiros do cinema norte-americano: David Wark Griffith. Através de quatro linhas narrativas situadas em diferentes épocas históricas e apresentadas em paralelo, o filme retrata o conflito atemporal entre o amor e a intolerância.
Considerado uma das primeiras superproduções do cinema e uma das obras mais influentes da era do cinema mudo, Intolerância apontava a incompreensão entre as pessoas como causa de dor e sofrimento para a humanidade. Paradoxalmente (pelo menos para as plateias de hoje), o filme anterior de Griffith, O Nascimento de uma Nação, tinha como tema a Guerra de Secessão nos Estados Unidos e, como heróis, membros da… Ku Klux Khan!
O fato de o mesmo cineasta que criticou a intolerância humana ter também feito um filme abertamente racista pode parecer espantoso e contraditório. Mas mostra o quão difícil é perceber a intolerância que está dentro de nós. Ao mesmo tempo em que facilmente criticamos o preconceito alheio, tendemos a minimizar nossas atitudes e falas discriminatórias. Mesmo quando elas se manifestam de forma tão clara e contundente como no coro racista no estádio do Valência contra o jogador Vinícius Júnior.
Os gritos de ódio de milhares de pessoas contra um atleta provocados pela cor de sua pele foram tratados pelo presidente da Liga Espanhola como “casos isolados” e minimizados por jornalistas esportivos locais como “reação a provocações do jogador”. Teriam tais declarações sido meros reflexos de defesa? Ou será que falta aos personagens em questão a plena consciência da própria intolerância?
Não raro aquele que veementemente se coloca contra o racismo discrimina os homossexuais. O que apoia o casamento entre pessoas do mesmo sexo se opõe ao ensino religioso. O que prega o amor de Deus a todas as pessoas defende a expulsão de imigrantes. O que insulta e agride quem tem ideias políticas diferentes alega “liberdade de expressão”.
Os mesmos estádios hoje alvo do escrutínio mundial pelos coros racistas, entoam cantos homofóbicos e xenófobos há décadas, sem qualquer reação pública. O combate à intolerância tem um caminho longo à frente.
Ainda longe do ideal de respeito mútuo universal, devemos seguir apoiando a luta de Vini Jr. contra quem o ataca por sua cor. E torcer para o dia em que todas as cores terão voz e serão bem-vindas. Ninguém quer um mundo como os filmes antigos: mudo e preto-e-branco.