Escritório Virtual – Boletim Novembro 2021

Intolerância

Dizem que quando Einstein chegou aos Estados Unidos, o agente da imigração solicitou-lhe que preenchesse uma ficha com dados pessoais. Num dos campos, lia-se: “Raça”.

Einstein, judeu que deixara a Alemanha ao pressentir a ascensão do nazismo, escreveu: “Humana”.

Verdadeira ou não, a história expõe um erro científico recorrente: afinal, na espécie humana, que chamamos homo sapiens, só há uma raça.


 

Homem vitruviano


 

Durante milênios, as sociedades humanas utilizaram as características visíveis de uma população — aquilo que a ciência chama fenótipo: cor da pele, dos cabelos e dos olhos, altura, compleição física etc. — como uma maneira de destacar povos que, na verdade, se distinguiam por sua cultura e costumes. Com o desenvolvimento da genética, ferramenta que a biologia passou a utilizar para organizar e classificar os seres vivos, verificou-se, contudo, que a variação genética entre humanos é mínima. E que pessoas com cor de pele diferente podiam ser mais próximas geneticamente que pessoas com a pele de mesma cor.

A despeito do avanço da ciência, a discriminação pelo fenótipo, em especial a cor da pele, é o preconceito mais comum e disseminado nas sociedades humanas. E ainda é chamado, anacronicamente, de racismo.

No Brasil, o preconceito contra os negros surge já em sua chegada ao Brasil na condição de escravos. Destinados às fazendas coloniais, executavam trabalhos braçais que não exigiam educação ou treinamento. Impedidos de estudar, acumular capital e deixar herança, os negros escravizados se viram aprisionados na base da pirâmide social, sem chances de ascender, geração após geração. A Abolição, concedida sem uma solução para integrar os ex-escravos à sociedade, não ajudou a reverter essa situação, que só recente e lentamente vem sendo corrigida.

Intolerância, palavra que tem sido ouvida mais do que gostaríamos, é o título de um filme clássico, de 1916, do diretor norte-americano David W. Griffith, que mostra momentos de intolerância ao longo da história humana. Ironicamente, o filme anterior de Griffith ficou conhecido como um exemplo infame de intolerância e racismo, ao retratar supremacistas brancos como heróis durante a Guerra de Secessão.

Reconhecer o próprio preconceito é um difícil exercício de autoconhecimento, porém é uma etapa necessária na construção de uma sociedade mais tolerante e justa. O passo seguinte, é a adoção de ações concretas, chamadas afirmativas, no sentido de dar oportunidades àqueles que são vítimas da intolerância. Leis de cotas, tão criticadas por alguns, são exemplos de ações afirmativas voltadas ao combate ao racismo estrutural.

O Brasil, tão orgulhoso de sua miscigenação, ainda é cruel com a população negra. A desigualdade de tratamento persiste em várias dimensões sociais e permanece um desafio a ser vencido. Este curto texto, escrito no mês em que se celebra o Dia da Consciência Negra, é uma humilde contribuição nessa luta.